Justiça condena SP a pagar R$ 750 mil por abordagem discriminatória da PM ao monitorar grupo que fazia tour sobre cultura negra

  • 24/04/2024
(Foto: Reprodução)
Valor da indenização será revertido a um fundo em favor da população negra por meio de projetos culturais e turísticos. Guias e 12 clientes explicaram que era passeio turístico no Centro de SP, mas policiais acompanharam todo o trajeto em motos e a cavalo. Cabe recurso. Caminhada Negra Arquivo pessoal/Felipe Benicio O juiz Fausto Dalmaschio Ferreira, da 11ª Vara de Fazenda Pública, condenou nesta quarta-feira (24) o estado de São Paulo a pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 750 mil por abordagem policial discriminatória e monitoramento injustificado durante a "Caminhada São Paulo Negra", ocorrida em 2020, nos bairros da Liberdade e Bixiga, na região central da capital paulista. Cabe recurso. O valor será revertido para um fundo em favor da população negra por meio de projetos culturais e turísticos. O g1 procurou o governo de São Paulo e aguarda posicionamento. Segundo a decisão, "a conduta do Estado representou atitude discriminatória, com contornos nítidos de racismo institucional, em desfavor de um grupo de turismo particular que se propunha, ostensivamente, a expor a história e cultura negra e sua tentativa de apagamento no centro de São Paulo”. O fundador do Guia Negro, Guilheme Soares Dias, considerou a decisão histórica. "Na época ouvimos de muitas pessoas que não ia dar em nada, que era só racismo. Mas o Estado precisa ser punido e situações como essa não podem mais ocorrer. Esperamos que esse dinheiro possa ser usado na formação de policiais e professores sobre cultura e história negra. A decisão é histórica ao reconhecer que casos como esse configuram racismo estrutural e representa uma grande vitória para o afroturismo e pro povo preto”, diz o fundador do Guia Negro, Guilherme Soares Dias. A Defensoria Pública, autora da ação civil, acredita que cursos antirracistas são fundamentais para instituições como a Polícia Militar. “A implementação de ensino da história e da cultura afro-brasileira nos currículos dos cursos de formação e capacitação dos policiais militares, as discussões, diálogos e iniciativas antirracistas são de suma importância no combate ao racismo estrutural e institucional", diz o defensor público Danilo Martins Ortega, coordenador-auxiliar do Núcleo Especializado de Defesa da Diversidade e da Igualdade Racial. Grupo de turistas e guias negros é acompanhado pela PM por 3 horas em walking tour no Centro de São Paulo, no sábado (24) Heitor Salatiel/Arquivo Pessoal/BlackBird Viagens A caminhada Em outubro de 2020, o projeto Caminhada São Paulo Negra foi seguido pela polícia militar durante três horas ao promover a sua tradicional caminhada turística, com visita a alguns pontos da região central da cidade de São Paulo/SP para resgate da memória da população negra na cidade de São Paulo, considerando o apagamento histórico na ocupação de bairros como o Bixiga e a Liberdade. O grupo que contava com 14 participantes, entre guias e interessados, foi acompanhado pela polícia militar, alegando a proibição de aglomeração na pandemia de Covid 19 e possível tumulto a ordem pública. Segundo a defensoria, a discriminação ficou patente quando o grupo cruzou com aglomerações maiores no caminho, formadas em razão do período de campanha eleitoral, sem que a polícia se importasse com esses outros grupos, mesmo que maiores do que o grupo visado. A BlackBird Viagens iniciou seus trabalhos em 2018 e possui entre seus roteiros a "Caminhada São Paulo Negra", que leva turistas guiados com informações sobre a cultura negra da Liberdade ao Largo do Paissandú. "Explicamos que se tratava de uma atividade turística, mostramos nosso CNPJ, dissemos que eram nossos clientes e garantimos que não haveria aglomeração justamente por ser um serviço pago, com limite de até 15 pessoas durante a pandemia", disse Guilherme Soares Dias, um dos sócios da BlackBird Viagem. 'Perseguição policial' Segundo Dias, ali teve início uma "perseguição" policial, que durou até a última parada, às 13 horas. O grupo seguiu com o passeio e se dirigiu para a Casa Preta Hub, novo espaço colaborativo no Anhangabaú, e foi acompanhado por policiais em motos. "Na saída optamos por subir a escada rolante do Vale, que não fazia parte do nosso percurso, para tentar despistar aquele acompanhamento arbitrário, mas demos de cara com uma cavalaria. Adiante, no Largo do Paissandu, outra equipe se apresentou, questionou novamente se era um protesto, e chegou a nos pedir que assinássemos um documento, o que nos negamos a fazer", continuou. Na ocasião, a reportagem questionou a Polícia Militar se a corporação confirma que acompanhou os guias e turistas negros por três horas e o motivo da ação. Em nota, a PM disse que "por se tratar de um evento com grande concentração de público foi realizado o acompanhamento, como regularmente é feito a fim de garantir a segurança do grupo e demais cidadãos". "Eram 12 clientes, não era uma aglomeração. Tinha muito mais gente na fila para a exposição dos Gêmeos na Pinacoteca e junto a uma candidata que fazia uma caminhada política, mas em nenhum momento deixaram de nos seguir. A gente percebe que realmente era uma perseguição ao nosso evento", disse Guilherme Soares Dias. "A nossa caminhada é uma valorização da cultura negra, e a gente gostaria de convidar a Polícia Militar a fazer parte dessa caminhada, para entender a importância e a potência desse trabalho, para entender que pessoas negras juntas não estão necessariamente se manifestando ou fazendo algo criminoso. Pode ser uma atividade cultural", completou.

FONTE: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2024/04/24/justica-condena-sp-a-pagar-r-750-mil-por-abordagem-discriminatoria-da-pm-ao-monitorar-grupo-que-fazia-tour-sobre-cultura-negra.ghtml


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